Realizada no dia 08 de Dezembro de 2012, a Ultramaratona de
Montanha, X-Run 60K foi realizada na bela cidade de Canela no estado do Rio
Grande do Sul, e marcou o final de 2012, como uma das provas mais sofridas que
já participei em toda minha vida.
Como já havia participado de uma ultramaratona de 56 km na
África do Sul, achava que poderia realizar bem esta prova, afinal eram apenas 4
km á mais. Seguindo esta linha de raciocínio, não levei em conta o principal
detalhe que difere muito as duas provas, ou seja, o tipo de piso, afinal correr
56 km no asfalto é uma coisa, e correr 60 km em montanhas, repletas de subidas,
buracos, pedras, raízes e mata fechada, é outra completamente diferente, e
porque não dizer, absurdamente pior.
Apenas com o intuito de realizar mais um sonho de completar
minha segunda ultramaratona, sendo esta a primeira em montanha, ouvimos a
buzina de largada por volta das 08:30 da manhã abaixo de uma garoa gelada,
típica daquela região.
Devido ao clima nos dias anteriores, e da garoa antes da
largada, tomei a decisão mais errônea da minha vida, ao escolher um tênis de
trilha (com cravos) para fazer a prova.
Para meu azar após uns 10 minutos de prova, o sol deu o ar
da graça e as estradas de terra estavam totalmente secas, e o tênis passou á ser
um terrível incomodo, pois alem de segurar minha passada, o mesmo acabou
literalmente “estuprando” meus pés.
Diferente dos outros atletas, corri sem apoio, e levei toda
minha suplementação e um squeeze com água na mão, e cruzei o primeiro terço da
prova, ou seja, o km 20 na terceira colocação geral com o tempo de 01:43:00,
sentindo-se super bem independente de já ter encarado algumas subidas
sofríveis, mas após isso o pior aconteceu.
Por volta do km 21, juntamente com outro atleta, me perdi
trilha adentro e acabamos entrando em uma mata fechada, sem ter o que fazer,
afinal, não sabíamos se estávamos no caminho certo ou não.
Após corrermos 5,5km no caminho errado, discutimos bastante
e resolvemos voltar, mas neste instante o sentimento de revolta dominou meu
lado psicológico, e como a prova já tinha ido para o espaço, queria somente
encontrar o caminho novamente e abandonar a prova, pois não tinha mais
motivação nenhuma para continuar.
Quando encontramos o caminho certo novamente, perdemos
aproximadamente 01:15:00, e sem apoio nenhum, pensei bastante e lembrei de todo
o esforço que fiz para chegar lá, todos os treinos exaustivos, além do fato de
realizar um sonho até então impossível, pelo menos para mim.
Segui em frente, totalmente desmotivado, e já entre os
últimos colocados, até o momento em que encontramos uma atleta de Porto Alegre,
que ao longo de seus 49 anos seguia firme e forte pelas trilhas que neste
instante recebiam um calor avassalador de 36 graus.
Ao chegar próximo ao seu carro de apoio, o atleta que estava
comigo, fez toda sua suplementação e se deu ao luxo de trocar seu par de tênis
para seguir em frente, e como estava todo ”destruído” resolvi continuar a prova
ao lado da atleta, que virou uma grande amiga, afinal, estávamos mal, mas
independente disto fomos batendo um longo papo durante á tarde toda.
Corríamos um pouco, e andávamos também, sempre admirando a
paisagem e rezando para aquele sofrimento acabar logo, afinal, o sol estava nos
desgastando cada vez mais.
Como tinha me perdido no caminho, corri 11 km á mais, e por
volta do km 45, não suportava mais ingerir gel de carboidrato e o sentimento de
náusea e diarréia foi intenso, fazendo com que eu parasse diversas vezes, para
depois continuar seguindo em frente.
Acredito que nos próximos 36 km o que mais pensei foi em
nunca mais encarar um absurdo desses, e continuar minha vida tranqüila em
triathlons e maratonas de rua.
À todo instante falava com minha amiga, que nunca mais na
vida faria uma loucura dessas, e é claro ouvia a mesma coisa como resposta.
Por volta do km 50 (61 já percorrido), alcançamos um atleta,
que estava muito mal, caminhando pela trilha.
Juntamos os três, e seguimos conversando bastante,
totalmente acabados, e acredito que nossas forças vinham das piadas que
contávamos para tentar descontrair aquele clima deplorável que assolava nossos
corpos.
Aprendi uma coisa muito bacana em ultramaratonas, que
diferente do triathlon, um esporte elitizado, onde a maioria dos atletas exibem
suas bikes caríssimas e nem ao mesmo olham na sua cara para lhe cumprimentar,
nas ultramaratonas, todos são camaradas, principalmente após 6 horas de prova
onde todos estão em estado deplorável, mas estão ali, prontos para ajudar uns
aos outros, e na linha de chegada, todos esperando para lhe cumprimentar com um
caloroso abraço e poder compartilhar histórias de atletas que da mesma forma
que são fortes, também são como “pintos no lixo” após desafiarem todos os
limites de seu corpo e cruzar a linha de chegada em estado deplorável, mas
mesmo assim com um sorriso no rosto.
No final, cruzamos a linha de chegada em 08:20:00 de prova,
por volta das 16:50:00 da tarde com um sol insuportável na cabeça, e como foi
bacana ver toda aquela turma de atletas “dementes” nos esperando para nos
cumprimentar, ajudar e dar muitas risadas conosco.
Fiquei com o pessoal apenas uns quinze minutos e voltei para
a pousada, afinal, precisava urgentemente de um banheiro.
Fiquei feliz da vida por realizar um feito em minha vida que
não tem preço, com uma sensação sem explicação, sensação esta que nenhuma
conquista material pode igualar, onde acima de tudo pude aprender bastante com
meus erros, adquirir uma experiência monstruosa e principalmente á respeitar a
natureza.
À todo momento pensava em nunca mais realizar uma prova
destas, mas como estou escrevendo esta resenha 20 dias depois da prova posso
dizer apenas uma coisa: - Eu não vejo a hora de fazer outra, e esta já está com
data marcada.
Dia 06/02/2013 vou participar da Cruce de Los Andes “Desafio
de Los Volcanes”, prova de 105 km em 3 dias largando na Cordilheira dos Andes
no Chile, chegando até a Argentina.
Agradeço á todos os amigos, minha família e minha treinadora
Cris Carvalho.
Abraço á todos e bons treinos.
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